domingo, 24 de julho de 2011

DISCOTECA: O bonde do tempo



O ano de 1978 foi um ano bastante produtivo, lembro-me bem. Em 365 dias consegui proezas hoje inimagináveis:  fiz teatro, televisão, namorei, vi várias peças minhas sendo encenadas por atores de renome e, claro, escrevi muito. Boa parte da minha obra teatral, principalmente comédias, data desse ano. Acredito que tenha sido um período feliz e despreocupado de minha vida, pois tive tempo suficiente para rir e fazer os outros rirem comigo. Por isso, revendo dias atrás meu baú referente ao ano especificado acima, reli minha peça musical - a única que escrevi no gênero até agora! - DISCOTECA. Até no título dessa obra, remeto-me aos anos 70, não é mesmo...? Fazia muito tempo que não a lia, apesar do livro estar sempre ali, em minha estante, implorando para que eu o relesse. Lembro-me que a escrevi para atores e atrizes escalados previamente por mim... Não digo que tenha sido uma peça sob encomenda, mas eu redigi esse texto pensando em quem seriam minhas personagens: os amigos e amigas de faculdade e teatro. Até tentamos montá-la na ocasião, mas um musical sem recursos nos anos 70 era vanguarda demais mesmo para a época. E o musical DISCOTECA permanece inexoravelmente inédito nos palcos brasileiros...
Relendo hoje, aos cinquoenta anos, algo que escrevi aos dezessete, concluí que o texto não me parece nem um pouco datado. Ao contrário! E garanto para vocês que não tive vontade alguma, -  como é meu hábito quando me releio! -, de mudar nem uma vírgula. Para ser sincero comigo mesmo, o que mais me seduziu nesse meu reencontro com a peça e seus personagens foram as letras que escrevi especialmente para incluir neste musical. Não sei se hoje, apesar de toda vivência acumulada, seria capaz de recriá-las com tanto sentimento, expressão pura de uma juventude que o bonde do tempo levou.
Abaixo, posto três dessas composições  para que apreciem comigo um pouco de meu pensamento adolescente nas vozes das personagens Gisa, Adelaide Lukas e Cici Prado, respectivamente: .

Eis o meu inconformismo:
Amo sem ser amada!
Amo-o com muito egoísmo...
Amar, redundância falhada.

Nunca fomos, bem sei, um casal...
Nunca fomos, nem mesmo um caso...
Eu fui secretamente sua e você meu mal,
pedaços de um joguete do acaso.

Eis o meu inconformismo:
Amo sem ser amada!
Amo-o com muito egoísmo...
Amar, redundância falhada.

Fui muito além da paixão,
Fui muito além de uma simples amante,
Cheguei a ter ilusão
de que seria só meu, estava confiante.

Eis o meu inconformismo:
Amo sem ser amada!
Amo-o com muito egoísmo...
Amar, redundância falhada.

Sou um pedaço de você.
Não tenho passado, nem presente!
Não interessa o que o futuro possa me oferecer
O que importa é o meu amor, inconsequente. ...

Eis o meu inconformismo:
Amo sem ser amada!
Amo-o com muito egoísmo...
Amar, redundância falhada.

Perdi você meu amor!
Eis o meu inconformismo, é verdade...
Só me restam dor e dor
em vê-lo aos pés de Adelaide.
***
O importante é o que virá.
Agitando minha alma peregrina.
E me pergunto, como ficará
aquele a quem a vida ensina?

Minha alma adormeceu cansada.
Acordou esvaziada...
Acreditou-se enganada...
Não sei se sou feliz ou sou um nada.

O importante é o que virá.
Reencontros, novos amores...
O que em minha vida entrará?
Alegrias ou dissabores?

Serei eu resistente
ao que o destino me reserva?
Ou serei de novo inconsequente
que nem o amor conserva?
O importante é o que virá.
Os falsos amores, os falsos amigos...
Não, falsidade não mais entrará...
Descarto os sofrimentos antigos.

Serei uma guerreira que resiste?
O sucesso apenas bastará?
O destino outra vez insiste
em deixar-me a Deus dará...

O importante é o que virá.
Sou uma heroína, venço qualquer batalha.
A vida me cobrará,
se tudo o que fiz foi bandalha.

Durante anos, este foi meu mundo.
Vivi, sofri muita altercação.
Sei que chorei, cheguei ao fundo...
Desci até o submundo,
mas fui feliz no Rotação.

O importante é o que virá.
É nisso que pensarei agora.
O amanhã, é esperar...
Vamos viver a nossa hora.
***

Foi um sonho e é só
que acalentei nestes anos.
E que se desfez como pó,
destruindo todos os meus planos.

Agora nada mais me resta
a não ser o esquecimento.
A vida hoje em dia me empresta
dor, fardo e aborrecimento.

Este é meu ato final!
Despeço-me de vez, se assim preferem...
Meu momento, agora, é triunfal...
Vou lhes dar o que querem.

Dizem que sou exibicionista,
mas o show não pode parar.
Quanto mais for sensacionalista,
mais audiência eu vou dar.

Aqui, em lágrimas imprevisíveis,
alegrá-los-ei com o fim de minha história.
Vocês terão os momentos inesquecíveis
Que permanecerão eternamente na memória.

Já lhes dei muita alegria,
já tiveram o meu talento.
Só o meu sangue, agora poderia
finalizar minha história a contento.

A vocês, meu último ato!
Entrego-lhes minha vida com amor...
Partirei para sempre, é fato!
Sucesso a todos e um beijo, sem rancor.


* DISCOTECA, o romance adaptado desta peça,  foi há pouco meses escrito por mim e está em negociações para publicação.